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03/11/2016

Desafiando a realidade

Perfil jornalístico

 

Todos nós somos movidos por sonhos. Para alcançar nossos objetivos sabemos que existe um preço. Esforço pessoal implica fidelidade, persistência e luta. No entanto, para algumas pessoas alcançarem os objetivos o preço a ser pago é mais alto. Existem fatores que interferem nos sonhos almejados. Dificuldades financeiras e estigmas sociais imobilizam muitas pessoas, transformando sonhos em ilusão. Tais barreiras são difíceis de serem quebradas.

A história que vou contar é de Francisco Arnaldo Patrício, alguém que tem quebrado essas barreiras. Ele tem 40 anos, solteiro, auxiliar de serviços gerais no Tribunal de Justiça de Goiás. Nordestino, natural de Iguatu, interior do Ceará, bem como seus dez irmãos. Em Goiânia ele mora com seu pai e dois irmãos. Sua mãe faleceu há algum tempo e seus outros irmãos se espalharam pelo país.

Um peregrino que colocou o pé na estrada atrás de uma vida melhor. Em migração do nordeste para cidades urbanas, ele primeiro foi para São Paulo aos 17 anos, mas não conseguiu emprego por falta de estudos. Depois decidiu vir para Goiânia aos 19 anos de idade.

O homem baixinho de fala acelerada ri de tudo, até de coisas sem sentido. Desajeitado. Desregulado de ideias, segundo o senso comum. Tem um olhar determinado e um sorriso inocente. É evangélico pentecostal, gosta sempre de falar “Glória a Deus”, em qualquer situação. Francisco expressa a imagem-síntese do nordestino, é um cearense orgulhoso de sua terra. Seu sotaque é típico do nordeste. Apesar de morar em Goiânia há vinte e um anos ele não foi influenciado pelo fala dos goianos.

Francisco escolheu romper as barreiras que o condicionavam a uma vida marginalizada. “Nós somos onze irmãos e nenhum se formou. Então decidi mostrar para eles que eu era capaz. Vivo para desafiar essas condições", afirma. “O Francisco chega a ser criticado pelos colegas que, na verdade, deveriam seguir o exemplo dele e entender que as conquistas na vida vêm através de esforço pessoal”, relata Neila Ribeiro, chefe de serviços gerais.

Francisco começou a trabalhar nos corredores do Tribunal como faxineiro, com seu rodo, pano e balde. Sempre limpava os corredores com sorriso no rosto, cumprimentando todos que passavam. Hoje ele trabalha carregando processos. Ele tem o sonho de ser alguém mais importante que trabalha no tribunal. “Penso em ser promotor, ao menos um servidor judiciário”, diz. Essa motivação o impulsionava a querer entrar no curso de Direito. “O Francisco lia livros que achava no lixo, para poder passar no vestibular”, relata Martha Moreira, servidora judiciária. Ele passou no vestibular do curso de Direito, na Faculdade Sul-Americana (FASAM) em 2008.

A determinação de Francisco sofreu abalos e até hoje não se formou, devido às dificuldades financeiras e repetição de matérias. Entretanto, Francisco nem cogita a hipótese de desistir de se formar em Direito.

Perguntei sobre as dificuldades para concluir o curso, ele olhou fixamente pra baixo, silenciou por alguns segundos e soltou uma frase bíblica: “Tudo posso Naquele que me fortalece”. Hoje Francisco está no 8° período de Direito e almeja se formar até o final do ano de 2017. Está comemorando por ter sido aprovado no teste de direção de moto e afirma que também será aprovado no teste de direção de carro. Para ser feliz Francisco conta sua fórmula: “Não tenho medo, tenho fé. Acredite em Deus, porque se não fosse Ele eu não estaria aqui”.